quinta-feira, 29 de abril de 2010

Aprendizados

Ávidos pelo gigante portão de mundo que se anuncia, eles carregam mais que cadernos nas mochilas, um baú de desejos irrequietos, os olhos cativos aos que os vêem na singularidade, alguns embriões de sonhos e dois potes inteiros de terra fértil, por vezes esparramada no caminho.

Adentro daqueles inquietos passos e olhares distraídos, levam uma fome ignorada, árvores de costumes pelas costas, carregando o peso que  aos olhos apressados passa despercebido. 
Impõem-se na aridez camuflada, como armadura desejosa de um igual respeito. Em seu pequeno histórico tantas casas já lhes foram demolidas, que a ansiada viagem da sabedoria impressa, por vezes lhes parece um luxo descabido, quando não se tem morada ao retornar.
Não estão suas histórias exatas como na aritimética, não estão a  espera de esmolas distorcidas, mas apenas o abandono dos fingidos óculos escuros, usando não de uma sabedoria hipócrita, mas carecem de mãos unidas para construir alicerces.

Raiana Reis

sábado, 24 de abril de 2010

Distâncias


Nunca consegui entender as distâncias pela medida quilométrica - esta que curiosamente leva o nome de uma outra feita pra calcular os pesos - confesso, nunca soube quanto tempo ou custo de viagem corresponde a cada Km percorrido... Eu sei, é a fita métrica cabível entre as rotas geográficas, entre os destinos traçados pelo mapa, é a prévia do saldo bancário com gastos em combustível. É verdade, todo motorista precisa entender de forma prática esse cálculo. Pois talvez essa minha ignorância assumida deve-se a dois motivos: a carteira de motorista, que entre os desvios de rota tornou-se apenas cédula de identidade, e as antigas viagens de ônibus quando menina, em que apenas queria insistentemente saber o tempo que me restava para chegar ao meu belo horizonte.
A medida em quilômetros faz ainda menos sentido nesse momento, onde as milhas facilmente são cruzadas pelos ares e os dias de viagem se transformam em horas. O coração sim, esse parece contar apressadamente a distância, não por metros, mas nas batidas ansiosas pelo momento da chegada, misturado com o pouco fôlego pelo distinto medo, fruto de tudo que é novo e que tem ao mesmo instante o poder de encantamento.
A madrugada fora insone, mas não estava sozinha, me acompanhava no elo virtual com a mesma ansiedade, aquele por quem aguardo a chegada.
É chegada a hora, o céu agora parece ser o transportador do encontro esperado. Das alturas por onde ele vem,  já deve avistar o mar que toca a cidade planejada e o faz recordar as antigas fotos. Os pensamentos, vagam com uma força multiplicadora das sensações por conhecer, essa aparente aventura está de mãos dadas com a incomum segurança surgida desde o início, naquela sintonia incontestável que sempre transformava os momentos cotidianos em uma cumplicidade mútua. O instante se aproxima, eu o espero!
As mãos estão frias apesar do clima quente, arrumo a cada cinco minutos o vestido branco com pequenos detalhes vermelhos, cuidadosamente encontrado para aquela ocasião, igual ele sonhara um dia. O vôo atrasa, parece uma prova de resistência para os pés que anseiam o mesmo chão. Retoco o brilho labial por umas duas vezes, conferindo no minúsculo espelho a minha insegurança, me pergunto novamente se o calçado baixinho era o ideal naquele momento e encontro a certeza nas pernas um pouco trêmulas após presenciar o pouso. Recordo então as frases humoradas sobre nossa velha companheira da vaidade... Respiro fundo, está tudo bem!
Agora eu que estava no alto e aquele vidro parecia embaçar ao procurá-lo entre aqueles que se faziam pequenos, descendo as escadas do pássaro de aço, estava quem eu tanto esperava... O reconheço, surgindo como de um presente desembrulhado, ele veste calças claras e uma blusa escura, combinando com seus cabelos. O coração parece errar a época do ano e começa fazer carnaval, embora num ritmo descompassado. Eu estava sorrindo e nem sequer percebia, sinto como se fizesse frio e calor ao mesmo tempo... Vejo seus passos seguros na nova terra que o recebe, percebo que me busca já com o olhar, nessa distância agora curta, tenta me encontrar  na vitrine de manequins móveis, e sorri. Eu aceno encantada, mas não sei se me vê, vou aguardá-lo no desembarque.

***
O portão de chek-out transforma-se em uma festa comum de convidados estranhos, todos aguardam ansiosos os seus, não importa se curtas ou longas distâncias, há uma expectativa entre os que esperam, com exceção dos executivos e sua indiferença perdida, aqueles que vem procuram na multidão seu alvo esperado. Alguns cumprimentam-se apenas no olhar, crianças festejam os pais que retornam para o abraço, amigos de longa jornada fazem surpresa na espera, casais beijam-se saudosos... Me distraio por uns segundos com a alegria de uma menina que chora com ternura ao abraçar seu pai, o pouco tempo distante que ele menciona surpreso com a emoção da filha, pareceu uma eternidade para aqueles braços pequenos que não o alcançavam por uns dias.
Volto ao meu mundo e ao retomar o olhar desejoso, já o encontro fitando-me! No encontro dos olhos sorrimos - sorrimos além dos lábios, a sensação era de todo o corpo sorrindo ao mesmo tempo - perco a programação dos movimentos na timidez que ele ressuscitara em mim e estendo tardiamente um dos braços em sua direção, chamando-o com um oi desconcertante!
Ele me puxa num abraço, não tão apertado, mas chamando-me pela cintura num êxtase de saudade já não contida. Existe agora o espaço apenas para nossos olhares, que já se misturavam...
Num mergulho esquecido do mundo ao redor, as bocas apenas calam, e conseguimos no olhar entender tudo o que diríamos agora. Percorro cada centímetro do seu rosto, suas sobrancelhas largas, seus pequenos olhos, e tocando suavemente o lado esquerdo de sua face, ele une-se ao meu sorriso no toque do beijo sem hesitação...
- Dessa distância sim, eu entendo.

Raiana Reis

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Dos mergulhos


E a voz insistente sempre chega aos ouvidos, ainda que tardia...


¬ Contenha-se antes do mergulho, não vá esquecer das pedras!  É ditado antigo menina, - Cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém!


¬ Está bem vovó... dos conselhos eu entendo, só me falta adestrar as teimosias.




Raiana Reis

terça-feira, 20 de abril de 2010

Do momento...



É certo que desde menina adorava as surpresas - agora, com o espichamento de corpo e idade, o gosto por ver olhos de estrelas ou o sorriso espantado daqueles que me são caros, tornou-se o melhor desejo...
No carinho ofertado dos gestos, não há intuito de receber  pagamentos, mas, estranhamente em uma noite de outono, o Sr. dos Acasos coloca embrulhado ao lado da cama um "Gerador dos Sorrisos Mais Sinceros"...

Raiana Reis

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Tango


E nos palcos cadentes da vida cabe aos duetos o desequilíbrio descompassado dos corpos?

Falo dessas dissonâncias de encontros que se dão pelo caminho, fora o ritmo forçado no início de uma contradança, após o forjar de intenções em se aprender o passo...
Compete apenas aos passionais a entrega? Esta que embora façam como o prazer solitário ao balé dos cines, num qualquer momento necessita o compasso pungente do seu par na bela valsa que lhes anseiam as pernas.
Questiono contrastes pelos inúmeros bailes desritmados que se apresentam nas vias públicas em que caminho. 
E já no costume do abandono no salão, ou aos tangos lacerados ao qual me destino, a cada melodia embute-me o freio - momentâneo, atendendo em sesguida ao risco dos tropeços pelo sabor do gesto, fugindo do blasé pela teimosia implícita da alma dançarina, que não dispensa os treinos acreditando até o último ato o seu ritmar.

Raiana Reis

domingo, 11 de abril de 2010

RaiN




Se esvaem de mim as palavras, arrastando-se para longe na força dessas águas, deixando-me no vazio mesquinho da quietude domesticada.
E estes rios que correm agora também molham por dentro, sem força para limpar garagens, mas encharcando os resquícios embaixo do tapete.
Não, não me importa as cobranças dos dias sempre ensolarados, as chuvas também são parte dessa essência, mas claro, não são cachoeiras, é fonte que dá e passa...

- RaiN Reis

sábado, 3 de abril de 2010


Que seja intenso, sem precisar da imensidão!
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